quinta-feira, 9 de setembro de 2010

[Ins]Piração

'Saudade é um pouco como fome [...]'
Clarice Lispector



Dá desespero ver os dias escorrendo pelo ralo, os minutos escapando pelo ar e tudo que era deixando de ser.

Dá vontade de agarrar uma época pelo pescoço e pedir pra ela ficar mais um pouco.

'Calma, isso é só o tempo passando.' - Contemporiza minha consciência. - 'Nada além disso, por favor vamos manter a calma.'

Dá vontade de ficar com a gente pra sempre, mas a gente escapa de si diariamente.

A gente pisca e já não é o mesmo, sorri e muda de pensamento, chora e muda de opinião. A verdade é que a gente se abandona a todo momento e só um distanciamento interpretativo é capaz de permitir conclusões tão óbvias: ando morta de saudades de mim.



Texto dedicado a todas as mudanças da vida, inclusive as mais imperceptíveis e importantes: aquelas que se passam dentro da gente.

13 comentários:

Ruy Barros disse...

Foi uma bonita passagem de tempo... aquele que passei aqui, a ler. Mas tal como o tempo, também eu preciso avançar, ler mais, etc... parar é coisa de relógio avariado, e eu não quero ser um :)

Moni Saraiva disse...

Às vezes a dor impede a gente de crer que passa. Mas passa, muda, inevitavelmente. E a gente até sorri depois.

Hoje, especialmente eu tô cheia de saudade. Uma saudade que eu não me puno de sentir. E vou vivê-la todinha até o fim do dia. O teu texto emoldurou isso...e me fez lembrar o Caio - o Fernando Abreu:

"E recomeçar é doloroso. Faz-se necessário investigar novas verdades, adequar novos valores e conceitos. Não cabe reconstruir duas vezes a mesma vida numa só existência. É por isso que me esquivo e deslizo por entre as chamas do pequeno fogo, porque elas queimam - e queimar também destrói."

Beijos querida!

LandNick disse...

"mas a gente escapa de si diariamente." E com isso, chega um dia que já não sabemos quem somos! E bate aquela saudade do que èramos em alguma fase da vida que também já não lembramos direito qual foi!
Muito bom!

Manuel Pintor disse...

Os tempos de mudança, os mais importantes, os que "se passam dentro da gente", são sempre tempos de descoberta. São, por natureza, tempos imbuídos de transitoriedade, de incerteza, de mil e uma aproximações e outros tantos distanciamentos interpretativos.
Bate-nos a saudade de nós, nesses tempos, mas nem sempre, quase nunca, saudade do que se nos tenha perdido algures no passado; mais, isso sim, do encontro com um novo equilíbrio com tudo em que, entretanto, nos tornámos. Diferentes.
Essa busca há-de ser achada, e novos tempos planos se sucedem...
Lembro-me de uma velhinha canção de Fausto:
"Atrás dos tempos.. vêm tempos e outros tempos hão-de vir".
http://www.youtube.com/watch?v=soXJRmxEoP4

A. T. Sergio disse...

Chorei por dentro com saudades do que fui um dia, mas sorri externamente demonstrando ser possível uma felicidade efêmera.

Em mutação constante, como esse ar que insiste em nos deixar vivendo...

Nanda disse...

Ah eu acho bem bacana essa coisa de ter saudade da gente, pq aquilo que a gente foi sempre fica ali em algum cantinho, a gente vai lá dá um abraço e pronto! fica melhor..
beijos!

Talita Prates disse...

quantas vezes não me pego pensando as mesmas coisas!

ahh, como é fugaz a vida,
e inexorável o tempo!

saudades do que fui,
saudades antecipadas do que vou ser (porque vai passar...).

linda reflexão, Flah.

Um beijo, querida!

Talita
História da minha alma

Lisiane disse...

Teu texto veio ao encontro de mim mesma, dos momentos que estou vivendo neste momento, de luto, de perda de mim mesma, de reconfiguração.

Nos subjetivamos todos os dias e resignificamos as coisas quando é preciso.
Mas vivemos na esperança de dias diferentes, acreditando que nosso eu venha a ser algo e acabamos perdendo a essência do ser hoje, de quem somos agora.

Apegamo-nos demais às situações e quando elas passam, passam com tal rapidez que o tempo nos ecorre pelas mãos e novamente vamos em busca de um eu mais completo, sem viver as pequena particularidades do momento.

Belo texto.

Abraços,

Lisiane

Anônimo disse...

Ao entrarmos num rio, nem ele, nem nós seremos mais os mesmos, já diria o filósofo.

'brigado pelas visitas lá no blog. beijos.

Anônimo disse...

Já dizia Lulu: "Tudo que se vê não é igual ao que a gente viu há um segundo".Rs. Gostei do blog.

Denise Portes disse...

Enquanto eu lia um poema seu no blog confrariadostrouxas, você descobria meu blog por aqui. Feliz coincidência já te sigo.
Gostei muito daqui.
Beijo
Denise

www.odeliriodabruxa.blogspot.com

Camila Paier disse...

Ando com uma saudade de mim - e da criatura Pollyanesca que era, ao lado dele. Será loucura, ou masoquismo? Saudade é mesmo como fome: só sara, quando saciada.
Beijos mil!

Camila Passatuto disse...

Não sou do tipo que gosta de mudanças. Sempre achei que quando uma coisa precisa ser trocada de lugar é pq há algo errado.
Mas existem momentos em que o vendaval bate e não tem como segurar nada em seu lugar.

Seus textos são gostosos de ler. Gosto muito.

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